A ARTE DE FAZER PERGUNTAS

“Os propósitos do coração do homem são águas profundas, mas quem tem discernimento os traz à tona” Provérbios 20:5
Coaching é um processo orientado por objetivos, centrado no cliente e baseado em um relacionamento de confiança. Consiste basicamente em ouvir, perguntar, agir e apoiar. Quero dedicar as próximas linhas em uma reflexão sobre a desafiadora arte de questionar.
Perguntas são uma das principais ferramentas de um coach para focar a conversa, fomentar a reflexão, estimular o cliente a “ir mais fundo ou mais alto”; e assegurar o comprometimento. Frequentemente as pessoas procuram um coach quando estão estagnadas. Analisaram a situação, e com as informações que possuem não conseguem elaborar uma solução factível. É como se estivessem dentro de uma “caixa”, não conseguindo olhar o mundo exterior com as possíveis soluções para a sua demanda. É função do coach, ajudá-la a sair da “caixa” e se mover na direção da sua criatividade e a consequente resolução do problema. No entanto é fundamental que uma base de confiança permeie a relação entre coach e cliente, sem a qual nenhuma pergunta surtirá o efeito desejado. O cliente tem que estar seguro de que será respeitado e apoiado em um ambiente de total sigilo e segurança.
Para se fazer boas perguntas, é importante saber que se trata de um aprendizado como qualquer outro, que requer muita prática. Todo coach iniciante tende a incidir em vários erros, que só o tempo e a persistência irão corrigir.Acho fundamental que todo coach tenha o seu próprio coach, visando o aperfeiçoamento. No entanto existem algumas técnicas, que de alguma forma poderão nos auxiliar nesse aprendizado. Quero me deter em algumas que julgo necessárias.
1. Perguntas de desconstrução
O primeiro conceito que precisamos desconstruir é o que entendemos como “obvio”, pois, o que é óbvio para mim não precisa ser para o outro. Da mesma forma, a interpretação de termos também não é tão óbvia quanto parece, pois, uma palavra pode ter diversos significados, principalmente quanto associados à prática. Por exemplo, em uma entrevista, um cliente pode afirmar: “Sou uma pessoa otimista”! Como o processo de coaching está associado ao contexto de ação, é fundamental perguntar a esse cliente: “O que pessoas otimistas fazem”? Com certeza poderíamos ter inúmeras respostas, do tipo:
– Pessoas otimistas veem o lado bom das coisas.
– Pessoas otimistas não se dobram diante das dificuldades da vida.
– Pessoas otimistas não são realistas, São sonhadoras!
Nesse simples exemplo percebemos que o otimismo pode estar próximo do positivismo, resiliência e ilusão. Digo próximo, pois mesmo essas expressões não podem ser tomadas como precisas e precisam ser descontruídas. Concluindo, três respostas totalmente distintas para uma palavra que poderia nos parecer tão óbvia. Todas expressões devem ser descontruídas através de perguntas até que se chegue à interpretação que o cliente dá ao termo.
Chamo a atenção para outro detalhe. Considere as perguntas abaixo:
1. “Você mencionou sentir-se “roubado” em seu tempo pessoal. Descreva o que você considera uma quantidade saudável de tempo pessoal”?
2. “Pelo que entendi, você disse que o trabalho estava dificultando você de ter tempo para si mesmo. Quanto tempo seria o suficiente”?
Apesar das duas perguntas focarem o mesmo assunto, observe uma sutil diferença. A primeira pergunta é a única que contém uma palavra dita pelo cliente, enquanto a segunda é parafraseada, não nos dando a certeza das palavras proferidas. As palavras são imprecisas por natureza, o que nos leva a interpretá-las, e é justamente nesse ponto que reside o perigo de deduzirmos o que não foi afirmado. Simplificando as coisas, apenas escute e pergunte exatamente com as mesmas palavras que você ouviu e que tenha dispertado a sua curiosidade.
2. Perguntas investigativas
Perguntas investigativas são usadas para explorar e coletar informações, e não para definir objetivos, resolver problemas ou decidir que medidas adotar. O objetivo é ajudar o cliente a pensar de forma mais profunda e criativa. A estratégia básica para desenvolver perguntas investigativas é selecionar o que o cliente disse de mais importante, e oferecer uma pergunta que o ajude a se aprofundar no assunto. Preste atenção em ênfases e emoções. Ressalto que emoções contêm valiosas informações sobre o que se passa no interior de uma pessoa, e são uma boa forma de identificar o que é importante.
Devemos investir tempo na coleta de informações. Temos uma tendência de entrarmos muito rápido no modo “solução de problemas”, razão pela qual poderemos perder informações importantes, que poderiam mudar por completo a nossa percepção. Quanto mais informações, mais material teremos para tratar das demandas e desafios. Abaixo alguns exemplos de perguntas exploratórias:
1. Descreva o problema que você está enfrentando?
2. Você alegou que se sentiu injustiçado. Pode descrever a situação?
3. Me de detalhes de como você chegou a esse ponto?
4. Que opções você já considerou?
5. O que já experimentou e quais forma os resultados?
6. Que tipo de resultado você busca?
Existem alguns detalhes para os quais quero chamar a atenção, quando o assunto é a investigação.
2.1. Boas perguntas investigativas são sucintas.
Muitas vezes vemos coaches tentando formular a “pergunta perfeita”, achando que o questionamento maravilhoso é a chave para uma grande descoberta. Quando terminar de transmitir todos os detalhes da pergunta, o cliente pode nem saber o que está sendo questionado. Vejamos um exemplo:
“Você estava me falando sobre o seu trabalho e o reconhecimento que recebeu. Percebi que o simples cumprimento do chefe não foi o reconhecimento que esperava, portanto não surtiu o efeito desejado. Estava me perguntando, o que a empresa poderia ter feito para que você se sentisse reconhecido”?
Que tal simplesmente substituir pela seguinte pergunta: “Que tipo de reconhecimento teve o maior impacto sobre sua vida”?
Fazer perguntas com excesso de informação, só distrai e não leva a uma solução. Deixe a conversa vir em sua direção, não tente moldá-la. Siga no sentido que o cliente já está e estimule-o um pouco mais no mesmo sentido. A responsabilidade do cliente é resolver o problema, a sua é de promover um ambiente criativo e de confiança. Seguem mais algumas perguntas que levariam ao mesmo resultado.
– “O que mais lhe traz satisfação no trabalho”?
– “Que tipo de reconhecimento é o mais importante para você”?
– “O que o motiva mais no trabalho”?
2.2. Boas perguntas investigativas são neutras.
Preste atenção na seguinte pergunta: “Por que afinal, você aceitou esse emprego”?
Note que essa pergunta não é neutra. O coach não está pedindo para o cliente pensar ou solicitando alguma informação. Por trás da pergunta existe uma sutil insinuação: “Você não deveria ter aceito esse emprego”! O uso da frase “por que” normalmente induz a pessoa a pensar que os motivos da escolha são impróprios, além da resposta, que normalmente é uma mera desculpa. Muitos coaches não usam perguntas com “por que”, pois é muito difícil tornar essas frases neutras. A pergunta acima poderia ser reformulada para: “Você pode me dar os motivos que o levaram a aceitar o emprego”?
3. Perguntas abertas
Todo processo investigativo deve nos levar a adotar técnicas que evitem armadilhas, que facilmente poderiam abortar o intento desejado. Devemos evitar perguntas que levem o cliente a respostas evasivas através de uma simples resposta “sim” ou “não”. Todo processo de coaching visa levar o cliente a criar opções e optar segundo seus próprios critérios; razão pela qual as perguntas devem gerar possibilidades. Alguns exemplos abaixo:
1. “Pode me dar detalhes de como isso aconteceu”?
2. “Que sentimentos você tem quando pensa sobre essa situação”?
3. “Me fale sobre os seus valores”?
4. “Que desafios essa situação trouxe para a sua vida”?
5. “Coloque-se no lugar da outra pessoa. Quais alternativas você enxerga a partir dessa perspectiva”?
6. “Quais são os três principais objetivos para esse ano? Fale sobre eles”!
7. “Quais são os maiores obstáculos que você precisa superar para atingir esse objetivo?
8. “Digamos que você pudesse eliminar todos obstáculos. Do que você precisaria para tomar uma boa decisão”?
9. “O que funcionou para você em situações similares no passado”?
10. “Posso pedir para você olhar por outro ângulo? Pode me descrever”?
4. Não responder por meio de perguntas
Nem sempre estamos com a disposição para dar o tempo necessário ao processo de exploração, o que pode nos induzir a sugerir sutilmente uma alternativa para solucionar a questão, fazendo perguntas como:
1. Você consegue encontrar essa informação na internet?
2. E se você fizesse um curso sobre o assunto em questão?
3. Pesquisei e cheguei a essas duas opções, qual é a mais importante para você?
Nesse caso, o coach está oferecendo uma solução em forma de pergunta, o que não é recomendável em coaching. A forma correta de mudar um hábito, consiste primeiramente em identificar o problema, e pedir ao cliente que o resolva em vez de darmos a solução.
1. Onde você poderia encontrar essa informação?
2. Como você poderia se instruir nesta área?
3. Que tipo de processo levaria a uma decisão com a qual você se sentiria bem?
Essas perguntas são mais abrangentes, permitindo que o cliente encontre suas próprias respostas. Soluções desenvolvidas pelo próprio cliente, geram um maior comprometimento e uma maior probabilidade de serem implementadas, pois se baseiam nas informações, situações e capacida-des do cliente.
Não há dúvidas quanto a existência de outras técnicas, no entanto volto a enfatizar na necessidade da conexão entre o coach e cliente, para que possamos prestar um serviço sem preconceitos e julgamento. Quando o coach suspende seu julgamento, acreditando no valor e na capacidade do seu cliente, as perguntas se tornam eficazes.
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Um comentário
muito bacana este conteúdo, gostei muito, irei voltar aqui outras vesez, eu adoro estudar sobre estes assuntos.